13.8.06

FOGO

São quatro horas e treze minutos da madrugada do dia treze de Agosto de dois mil e seis, e o desespero começa a apoderar-se dos corações mais frágeis…

Numa noite calma de Agosto, ao se debruçar no beiral da janela do seu quarto, começou a sentir uma brisa de leve nos seus cabelos soltos. Voltou para a cama pensando que esta noite iria ser calma… mas depois do seu primeiro sonho, na alvorada da madrugada, ouviu-se o som trémulo do espanta espíritos colocado naquela janela. Pensando que nada estava perdido e que a natureza sabia o que fazia, voltou a esticar o seu corpo cansado e ensonado nos lençóis ainda quentes. Mal conseguiu fechar os olhos e ouviu ao longe o ressoar da sino da capela da aldeia (como sempre soube, aquele sino quando tocava era porque algo de alarmante acontecera) levantou-se, sobressaltada juntamente com seus pais e esperou pelo veredicto, era o que receava… o fogo… o inferno… o clarão que se avizinhava por detrás dos montes em direcção à pequena aldeia onde sempre viveu.
No auge da situação escutou-se palavras insípidas, olhares distantes, olhares que por muito que escondam derramam um pouco de água salgada. Impotentes – muitos pensam – traidores, assassinos, loucos, humanos incompreensíveis e desalmados.
Sem poder fazer nada, sentiu-se perdida, rendida ás evidencias e aos factos, e não conseguiu suster aquela lágrima que teimava em cair. Preocupada, a percorrer a casa descalça de um lado para o outro, só conseguia pensar no sonho que tinha tido e na palavra que lhe aflorava no cérebro em chamas: IMPOTENTES.

Impotentes perante o fogo
Impotentes perante a vida
Impotentes perante a morte
Impotentes perante a lei do mais forte.

Impotentes parecem
Impotentes esquecem
Impotentes serão
Impotentes perante a multidão.

Isto foi o que lhe saiu enquanto deambulava sem saber que fazer, isto foi o que lhe permaneceu no pensamento…

Com o amanhecer vieram as noticias, não eram animadoras, tinha que estar preparada para o esperar… nunca o tinha visto, nunca o tinha combatido nunca o queria ver, nunca gostara dele…

Mas o bom filho ao pai torna, se ele veio de cá, também vem para cá.

Por muito que lhe custasse não queria ver a aldeia onde nasceu esmorecer, desaparecer sob as cinzas dolorosas, sob o cheiro das almas penosas, sob o pavor da pena e sofrimento, sob o horror que o fogo deixa por onde passa.

1 comentário:

betty_boop disse...

Poema "Fogo!"

(2º poema do meu novo livro "Eu vi!")

Fogo.jpgEu vi... Portugal inteiro,
tomado pela emoção
quando, em Verão traiçoeiro,
esta terra num braseiro
se tornou, chorar em vão.

Porque o fogo, às escondidas,
brincava com todos nós.
Lambia as casas perdidas,
galgava serras, vencidas,
vinha... ao som da nossa voz.

É um bandido bonito,
assassino aterrador,
medonho e lindo; o maldito.
Acendem-no com um fito:
ver-lhe a beleza, o fulgor.

De línguas mil, o malvado,
é belo de estarrecer.
Labaredas de encarnado
e amarelo que, a correr,
lhe sustentam o bailado.

Serpenteia na floresta,
d'arvoredo centenário.
Eleva-se, ruge em festa,
colorido, desembesta.
Combatê-lo é um calvário.
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14/09/2003
Laura B. Martins
Soc. Port. Autores n.º 20958